A Fábrica

Abril 29 2006
O Chelsea FC sagrou-se este sábado bicampeão inglês em grande estilo. Ao receber em Stamford Bridge o seu adversário directo na corrida pelo título, o Manchester United FC de Cristiano Ronaldo, a turma de José Mourinho necessitava apenas de um empate para revalidar o ceptro. Porém, os "blues" quiseram fazer a festa da melhor forma possível e bateram o United por claros 3-0, com Ricardo Carvalho a apontar o derradeiro golo.
E para que não restassem dúvidas sobre de quem era o dia, William Gallas fez o 1-0 logo aos 4 minutos, de cabeça, na sequência de um pontapé de canto apontado por Frank Lampard. Um golo que surgiu cedo, mas que espelhou a superioridade da formação do Chelsea, que apresentou Paulo Ferreira e Ricardo Carvalho a titulares, para além de Maniche no banco de suplentes. Com Cristiano Ronaldo na equipa, os "red devils" tentaram reagir e Wayne Rooney esteve perto de marcar aos 21 minutos. Porém, o Chelsea tinha total controlo sobre as operações.
Quem esperava uma reviravolta dos visitantes na segunda parte, enganou-se redondamente. Aos 60 minutos, o Chelsea aumentou a vantagem para 2-0, desta feita por intermédio de Joe Cole, e a festa começou em Stamford Bridge. Mas o melhor momento da tarde ainda estava para vir. Aos 73 minutos, o português Ricardo Carvalho efectuou uma grande jogada e aumentou para 3-0, para gáudio dos adeptos que enchiam o estádio. O jogo estava resolvido e Chelsea sagrava-se campeão de Inglaterra pela segunda temporada consecutiva.
Um ano menos um dia depois, José Mourinho voltou a festejar um troféu e continua "em grande", apesar de esta ter sido a época "menos conseguida", ao contabilizar "apenas" um sucesso.
Envergando um cachecol de Portugal, Mourinho esteve no centro da festa que se antecipava, recebendo pelo quarto ano consecutivo um troféu de campeão nacional - depois de dois pelo FC Porto, em Portugal, agora dois pelo Chelsea.

Verdadeiro ídolo do Chelsea, a quem "deu" dois dos três campeonatos do historial, o "manager especial", como ele próprio se chamou, nasceu em Setúbal a 26 de Janeiro de 1963 e atinge os 43 com o melhor palmarés de treinador da actualidade, por muito que isso irrite a concorrência.
Em 2005/2006, o Chelsea falhou na Liga dos Campeões (eliminado pelo Barcelona), na Taça (afastado pelo Liverpool) e na Taça da Liga (pelo Charlton), mas no campeonato conseguiu uma bela proeza, liderando da primeira à última jornada.

No entanto, nem tudo são rosas para Mourinho apesar de ter conquistado o segundo título consecutivo. Em declarações após o jogo com o Manchester United, o "Special One" surpreendeu: "No decurso da época pensei mais do que uma vez em bater com a porta e ir-me embora no final da temporada. Este é o pior clube do Mundo para se ser treinador, mas estou muito, muito feliz por ter decido ficar, porque ao fim e ao resto é um clube especial".
Mais adiante, José Mourinho explicou o porquê do seu mau estar: "Antes do início da temporada tivemos nove jogos sem perder e mais tarde conseguimos outra fase de muitas vitórias, mas nunca, nunca, nunca fui escolhido para 'treinador do mês'... Ninguém te reconhece o mérito se fores treinador do Chelsea... Posto isto, percebe-se porque é que eu devia ser o treinador mais feliz do Mundo, após ter ganho dois campeonatos seguidos, mas na realidade não sou...".
Parabéns ao "Special One", ao Silvino, ao Paulo Ferreira e ao Ricardo Carvalho.
Fontes:Uefa, Lusa e Jogo.
publicado por Armando S. Sousa às 19:43

Abril 29 2006

José Mourinho é, indiscutivelmente, uma personalidade controversa. No entanto, algumas das opiniões acerca dele começam a exasperar-me, chegou a um ponto de que quase não pode fazer nada sem aparecerem logo os iluminados a criticar, a chamar a atenção para os seus pensamentos, palavras, actos e omissões. É, por isso, que forma nobre e altiva (ao contrário de arrogante) como resiste aos ataques de uns quantos amantes da subserviência é claramente algo digno de ser realçado.
Como abutres a rondar uma carcaça de um animal doente, esperam um sinal de fraqueza que lhes garanta uma posição de vantagem de modo a sentirem-se bem consigo próprios e a conseguirem esquecer as suas próprias frustrações. O que é vago e incoerente nesta tentativa de o desacreditar é a argumentação aplicada. O epíteto de arrogante é, por isso, altamente discutível e o seu significado depende claramente de quem o profere. Sendo assim, as razões para estes ódios de estimação resumem-se rapidamente.
Por conseguinte, há pessoas que não sabem lidar com o seu insucesso e, ao mesmo tempo, vivem permanentemente na esperança que alguém lhes descubra o seu talento escondido. Só que as oportunidades e o tempo passam de forma vertiginosa, escapando ao seu controlo. Se, num determinado momento, uma pessoa se destaca dos seus pares, estes interpretam este facto como uma lembrança permanente da sua vulgaridade existencial. Não passam de quase virtuosos e sabem-no. O quase faz toda a diferença, sendo responsável por este estado de frustração em que vivem, sem se conseguirem libertar da pergunta que os destrói como uma doença – Porquê ele e não eu?
Então, quando o sucesso alheio vai ganhando substância ao ponto do consenso quase generalizado, este sentimento transforma-se em ódio visceral, assumindo o objecto de ciúme um papel de inimigo de estimação a ser criticado e ridicularizado a cada oportunidade. Partindo do princípio que as pessoas não concebem ser indiferentes aos outros, é como se tudo o que o odiado disser ou fizer configure uma provocação pessoal.
O que acontece, normalmente, é que quem tem sucesso a este nível, raramente dá razão para se atacar o trabalho e, portanto, as opções de ataque limitam-se ao homem., sendo esta atitude uma demonstração de ódio pessoal perante a ausência de outros argumentos.
Surge então a inveja que se traduz de várias formas. Há aqueles que invejam sem desejar o mal, porque é próprio da natureza humana, e há os outros que invejam e que, como resultado de alguma lucidez relativamente à sua própria mediocridade, não lhes basta invejar, desejam claramente que quem atingiu um patamar que eles almejam apesar de o saberem ser inatingível, caia em desgraça. É como se, no seu íntimo, preferissem dizer coitadinho do drogado do que parabéns pelo sucesso.
A inveja, como escreveu e muito bem na revista DEZ, é a arma dos incompetentes e dos frustrados. Provavelmente não é à toa que a última palavra dos Lusíadas é Inveja. Camões, na sua imensa capacidade de metaforizar os defeitos dos portugueses, escolheu talvez a mais marcante de todas.
Mourinho suscita este tipo de sentimentos e ambiguidades. Todavia, como alguém um dia disse – A modéstia é uma qualidade excessivamente valorizada. José Mourinho não é modesto, mas, indiscutivelmente não o pode, sob pena de cair no ridículo, nem tem que o ser. Os resultados estão à vista. Só não vê quem não quer, ou então tem uma compreensão errada da natureza da estatística. No caso de Mourinho, pode não gostar-se do estilo, mas pelo menos respeite-se o óbvio.
Na mesma medida, é irrefutável dizer – A falsa modéstia é um defeito excessivamente desvalorizado. Os falsos modestos que grassam pelo mundo, de quem todos aparentemente tanto gostam, para além do grave defeito de carácter, gostam de ser bajulados, necessitam, em regime permanência, que quem os rodeia se refira à sua grandeza para que, também quem o diz, não se esqueça desse facto.
É como se quem tiver sucesso tiver de pedir desculpa pelo facto de o ter. Ora, isto configura uma inversão dos conceitos e a pergunta do ignóbil jornalista espanhol é bem elucidativa disso mesmo. Para além da resposta que teve, a sua intervenção é uma tentativa de insulto que rebate para quem o proferiu. A questão era ofensiva, redutora mas revela mais sobre quem questiona do que sobre o questionado.
Carlos Tê escreveu e Rui Veloso deu a voz a um pensamento que melhor traduz estes sentimentos:
"...Já bebi a minha conta
E a taberna está fechada
Vinguei-me hoje da afronta
Que o mundo me fez passar
Passam-se os anos na pele
Numa azia sem sentido
E a gente acumula o fel
Do tempo mal digerido..."
Ainda no seu artigo semanal na DEZ, faz referência ao desperdício do potencial humano. A exortação à inteligência por parte de algumas pessoas que se julgam os donos do mundo, como Sousa Cintra no Sporting quando despediu Bobby Robson e Mourinho, é reveladora disso mesmo. C
oncordo, plenamente, com a análise de Mourinho da realidade Portuguesa.
O fado português traduz-se, também, na opinião que têm no estrangeiro dos nossos concidadãos. É como se a cidadania portuguesa fosse uma espécie de doença contagiosa. Sobre os que andam a “pastar”, eu fui um dos que ao ler as suas palavras aprendi uma lição. Neste momento posso dizê-lo com toda a segurança jamais deixarei de defender um clube português e o segundo clube do meu coração será aquele onde José Mourinho estiver.
A juntar a isto, alguns insuportáveis comentadores desportivos, que aos cinco minutos de jogo, recorrente a advérbios de tempo demasiado enfatizados pelo timbre da voz (O Chelsea não está a jogar absolutamente nada), parecendo, desta forma, que naquele e em qualquer outro momento, a equipa tivesse a obrigação de estar a dar um banho de bola e a ganhar cinco a zero. Além de tentar anular o mérito de Mourinho, desvalorizam os seus adversários de forma atroz.
Finalmente, como português que é e se afirma pela competência, tem que ser duas vezes mais competente que um brasileiro (os donos da sapiência futebolística por direito próprio auto proclamado), 3 vezes mais competente que um espanhol (para quem Portugal e os portugueses são uma província e um povo abandonados por que não desejados), 4 vezes mais que um francês (o pais onde os Manueis e as Marias eram empregado para fazer o trabalho que os franceses não queriam sendo depreciativamente tratados por isso mesmo) e seis vezes mais competente que um inglês (que se acham acima de toda a humanidade). Só assim terá a aceitação de todos.

Filipe Pinto.(Postado em 15 de Março)
publicado por Armando S. Sousa às 11:19

Abril 28 2006
Em Abril de 1936, mais precisamente no dia 23, o decreto n.º 25 539 criava a Colónia Penal do Tarrafal, na ilha cabo­‑verdiana de Santiago. A criação daquele que ficou conhecido como o “Campo da Morte Lenta” foi mais um passo decisivo na instauração de um regime fascista em Portugal, em muito semelhante aos que vigoravam na Itália de Mussolini e na Alemanha de Hitler.
«Quem vem para o Tarrafal vem para morrer!». Assim recebia os presos Manuel dos Reis, durante anos director daquela “Colónia Penal”. Estas palavras resumiam como nenhumas outras os verdadeiros objectivos que estiveram na base da criação do campo de concentração do Tarrafal. Muito para lá do objectivo hipocritamente proclamado no decreto fundador, de «recolher os presos condenados a pena de desterro, pela prática de crimes políticos», com a criação do campo de concentração pretendia­‑se a eliminação física dos opositores políticos do fascismo.
Durante os 18 anos em que funcionou, o Tarrafal ceifou a vida a 32 antifascistas, entre os quais o secretário­‑geral do PCP, Bento Gonçalves. Alguns dos prisioneiros acabariam mesmo por falecer anos depois de expirada a pena a que tinham sido condenados. Muitos dos presos nunca tiveram pena sequer. Era assim a “legalidade” fascista… Durante este período, passaram pelo campo da Achada Grande do Tarrafal, na ilha de Santiago, 340 prisioneiros, que cumpriram, somados, um total de dois mil anos, onze meses e cinco dias de prisão.
Outro ponto do decreto fundador do campo de concentração apontava a instalação da “colónia penal” num local que salvaguardasse as «melhores condições de salubridade e funcionamento». Suprema hipocrisia. Mais uma vez, a realidade revela a verdadeira natureza do campo e os seus objectivos. A Achada Grande do Tarrafal é, do ponto de vista climático, uma das piores zonas de Cabo Verde.
Afirma Cândido de Oliveira, no seu livro Tarrafal, o pântano da morte, que na região não havia água potável e que «nada ali se produz a não ser milho – e quando chove». Prosseguindo o seu relato, denunciava: «As “condições necessárias” satisfatórias, evidentemente, significam a instalação da colónia num pântano da baía do Tarrafal, na zona de mais intenso paludismo de Cabo Verde; e a certeza de que a maioria dos deportados seria dizimada pela biliosa ou ficaria com a saúde tão abalada pelo paludismo crónico que, regressados à metrópole, não teriam vontade de prosseguir na actividade antifascista.»
Somando a isto a falta de medicamentos, a má alimentação, os trabalhos forçados e a brutalidade dos carcereiros, pouco ou nada destinguia o Tarrafal dos muitos campos de concentração que, na época, polvilhavam o continente europeu. Os objectivos eram os mesmos. Os métodos também.
Com o fim da II Guerra e com a derrota dos aliados ideológicos do fascismo português, a manutenção de um campo de concentração torna-se insustentável. Graças à luta do povo português e à solidariedade internacional, a ditadura é obrigada a encerrar o Tarrafal em 1954. Ainda voltaria a abrir, anos mais tarde, para encarcerar os patriotas angolanos que combatiam o colonialismo português.

«TUDO CONTRA A NAÇÃO, NADA CONTRA A NAÇÃO!»

A criação da Colónia Penal do Tarrafal, em Abril de 1936, e a chegada dos primeiros prisioneiros, em Outubro do mesmo ano, foi um passo decisivo e particularmente brutal na fascização do Estado. Mas esteve longe, muito longe, de ser o único.
Tomando como modelo a Itália de Mussolini, o salazarismo começou desde cedo a construir o edifício fascista em Portugal. Em Julho de 1930 é criado o partido único, a União Nacional e, em 1932, o ditador formula a sua concepção de “Estado forte”: reforço dos poderes do governo, abolição dos partidos e interdição dos sindicatos, manutenção da censura imposta com o golpe militar de 28 de Maio de 1926, modernização da polícia e das forças armadas. A Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE), que antecedeu a PIDE, é criada em 29 de Agosto de 1933.
A 19 de Março de 1933 é proclamada a Constituição, depois de um “plebiscito” em que é reprimida qualquer propaganda da oposição e as abstenções são contadas como votos a favor. Com a promulgação da Constituição, o fascismo institucionalizava-se e terminava o chamado “período de transição”, iniciado com o golpe de 1926. Em Setembro do mesmo ano, é publicado o Estatuto do Trabalho Nacional, à semelhança da Carta del Lavoro italiana. São criados os “Sindicatos Nacionais” e é imposto o modelo corporativo de organização dos trabalhadores, do patronato, e da sua relação com o Estado.
Em 1935, os funcionários públicos passam a ser obrigados a assinar uma declaração anticomunista e o governo é autorizado a suspender e a demitir das suas funções aqueles que não derem provas de aceitação e fidelidade aos princípios da Constituição fascista. São demitidos milhares de funcionários públicos. No ano seguinte, e à imagem da Alemanha nazi, é criada a Mocidade Portuguesa e a Legião Portuguesa.
Ao mesmo tempo, o fascismo promove a concentração capitalista. Como escreveu Álvaro Cunhal no Rumo à Vitória, «em 1926, na indústria, como na banca e no comércio, ainda a média burguesia tinha um peso considerável. Ainda na maior parte dos ramos industriais estava ausente o domínio monopolista». O golpe militar de 1926 e a ditadura fascista, prossegue, «foi preparado e executado pelas forças reaccionárias do grande capital e dos grandes agrários. O objectivo foi pôr o aparelho de Estado ao seu serviço, arredar do poder a pequena e a média burguesia, travar o movimento operário».

«UM RECTÂNGULO DE ARAME FARPADO»


«O campo de concentração do Tarrafal é um rectângulo de arame farpado, exteriormente contornado por uma vala de quatro metros de largura e três de profundidade. Tem duzentos metros de comprimento por cento e cinquenta de largo e está encravado numa planície que o mar limita pelo poente e uma cadeia de montes por Norte, Sul e nascente». Assim descreve Pedro Soares o campo de concentração para onde foi enviado em Outubro de 1936 e, depois, novamente, em 1940.
Com a terra tirada para fazer a vala, foi feito um talude «que se eleva a três metros acima do nível do campo». Lá dentro, prossegue, «há apenas quatro barracões sem higiene, algumas barracas de madeira, nas quais estão instaladas as oficinas e o balneário, uma cozinha, sem condições de asseio, e algumas árvores».
No seu relato, o comunista (falecido pouco depois do 25 de Abril num acidente de viação juntamente com a sua companheira Maria Luísa da Costa Dias) destacava ainda que «a falta de vegetação, os montes escarpados, o mar e o isolamento a que os presos estão submetidos, dão à vida, aí, uma monotonia que torna mais insuportável o cativeiro». Como únicos vestígios do mundo, havia o «ar carrancudo dos guardas e das sentinelas negras que vigiam, as cartas das famílias que demoram meses a chegar, e dias a ser distribuídas, os castigos e os enxovalhos, os trabalhos forçados, as doenças e a morte de alguns companheiros».
Pedro Soares encontrava-se no grupo de 150 presos que inauguraram, em Outubro de 1936, o famigerado campo. Durante quase dois anos, foram alojados em doze barracas de lona, com sete metros de comprimento por quatro de largo, onde deveriam viver doze homens. «Essas barracas, que o sol e a chuva depressa apodreceram, serviram para nos arruinar a saúde.»

A “FRIGIDEIRA”

Se o Tarrafal passa à história como o “Campo da Morte Lenta” muito o deve à famosa “frigideira”, uma caixa de cimento para onde eram enviados os presos que ficavam de “castigo”. Conta Francisco Miguel, histórico militante comunista, que «lá dentro era um forno» e que «aquela prisão merecia o nome que lhe tínhamos dado».
Num impressionante relato, o comunista recordava: «O sol batia na porta de ferro e o calor ia­‑se tornando sempre mais difícil de suportar. Íamos tirando a roupa, mas o suor corria incessantemente. A “frigideira” teria capacidade para dois ou três presos por cela. Chegámos a ser doze numa área de nove metros quadrados. A luz e o ar entravam com muita dificuldade pelos buracos na porta e em cima pela abertura junto ao tecto.»
Mais adiante, Francisco Miguel lembrava que «pouco depois de o Sol nascer já o ar se tornava abafado, irrespirável. Despíamos a roupa e estendíamo-nos no cimento para nela nos deitarmos. O Sol ia­‑se erguendo sobre o horizonte e o calor aumentava, aumentava e suávamos, suávamos. Sentíamos sede, batíamos na porta a pedir água, mas não tínhamos resposta. A água da bilha não tardava em ficar quente. Havia momentos em que a sede era tanta que passávamos a língua pela parede por onde escorriam as gotas da nossa respiração que ali se condensava. Os dias pareciam infindáveis. Suspirávamos pela noite, pois o frio nos era mais fácil de suportar. Mas pelo entardecer também a sede aumentava. A excessiva transpiração não era devidamente compensada. A “frigideira” matava». Francisco Miguel passou na “frigideira” mais de cem dias. A sua saúde ficou arrasada. Mas, como muitos outros, não cedeu.
Gustavo Carneiro.
Avante!
publicado por Armando S. Sousa às 12:40

Abril 26 2006

Escrevia ontem no jornal Público, o ex. Presidente da ex.União Soviética, Mikhail Gorvatchov, que “ o desastre nuclear de Tchernobil…foi, ainda mais do que o lançamento da minha Perestroika, a verdadeira causa do colapso da União Soviética cinco anos depois. De facto, a catástrofe de Tchernobil foi um momento de viragem histórico :houve uma era antes do desastre e há uma nova era depois dele”, sendo verdade que o colapso da União Soviética, foi um dos acontecimentos históricos mais significativos para o Mundo, no último quarto do século passado, o preço pago e a pagar, é demasiado elevado.
Há 20 anos, em 26 Abril de 1986, o mundo acorda para o pesadelo dos desastres nucleares .

Às 01h23 da manhã, explode o reactor número quatro do complexo nuclear de Tchernobil, na União Soviética. O incêndio provoca a destruição parcial do coração do reactor que, no momento, funcionava a apenas sete por cento da sua potência normal, pois encontrava-se em fase de descarga de combustível. Às 01h25 os bombeiros da central começam a atacar o incêndio. Às 02h15, as autoridades de Pripyat (localidade mais próxima) interditam a região num raio de 15 quilómetros. Entretanto, a estação meteorológica mais próxima regista um aumento anormal de radioactividade. No dia 27, com a extinção do incêndio, começa a evacuação de 50 mil pessoas da cidade de Pripyat, em 1100 autocarros formando uma coluna de 27 quilómetros. Na Ucrânia, as autoridades estendem o perímetro de segurança para 30 quilómetros. No dia 28, o ministro sueco da energia e o ministro do ambiente da Dinamarca solicitam à União Soviética explicações sobre a origem da poluição radioactiva detectada, fazendo-se a evacuação dos habitantes num raio de 30 quilómetros da central. Às 21h00, a agência noticiosa soviética, TASS, emite um comunicado do Conselho de Ministros da União Soviética, admitindo um acidente nuclear em Tchernobil, com uma quantidade indefinida de mortos.
Sobre este atraso na divulgação da notícia ao mundo, diz Gorbatchov, que “…o mundo soube do desastre através de cientistas suecos, criando a impressão de que estávamos a esconder alguma coisa. Mas, na verdade, não tínhamos nada a esconder e, simplesmente, não tivemos qualquer informação durante um dia e meio. Só alguns dias depois soubemos que o que aconteceu não foi um simples acidente mas uma verdadeira catástrofe nuclear…” .
A nuvem radioactiva afectou principalmente a Ucrânia, a Finlândia, a Suécia, a Polónia, a Alemanha Ocidental e Oriental e a França. Além das perdas humanas, a radioactividade de Tchernobil contaminou os solos e águas de 137 mil quilómetros quadrados de territórios na Ucrânia, na Bielorússia e na Rússia. Tchernobil inutilizou ainda 114 mil hectares de terra e 492 mil hectares de floresta, forçando cerca de, 400 mil pessoas a abandonarem as suas habitações. O acidente provocou a morte de 59 pessoas e libertou uma radiação duzentas vezes superior às bombas atómicas de Hiroxima e Nagasáqui.
“Tchernobil abriu-me os olhos como nenhum outro acontecimento: mostrou-me as horríveis consequências do poder nuclear, mesmo quando não é usado para fins militares. Agora todos podemos perceber melhor o que aconteceria se uma bomba atómica explodisse. Há cientistas que dizem que apenas um SS-18 pode conter 100 Tchernobils.”, diz Gorbatchov.

Fotografia, EPA/Sergey Dolzhenko. Vyacheslav Konovalov, biólogo ucraniano exibe um feto humano e um de um porco. Konovalov estuda as mutações biológicas provocadas pela exposição a radiações.
Passados 20 anos sobre Tchernobil, ainda não há consenso sobre o número de vítimas. Segundo a Organização das Nações Unidas, apenas 59 pessoas morreram devido ao acidente e estima em 4 mil o número dos que podem vir a perder a vida devido a cancros. Por sua vez a Organização Não Governamental, Greenpeace, garante que o acidente causou, nos países mais afectados, a Ucrânia, a Rússia, e a Bielorússia, cerca de 200 mil mortos.

Dados apresentados por cientistas apontam para que mais de 200 mil de pessoas nas próximas gerações possam continuar a ser afectadas pelo maior acidente do género da história da humanidade. Actualmente, a radioactividade libertada é associada a aproximadamente quatro mil casos de cancro na tiróide. Cientistas israelitas e ucranianos também descobriram evidências de que pequenas doses de radiação poderiam provocar mudanças no ADN humano e que estas passam para futuras gerações. As análises a crianças, que nasceram depois da explosão de Tchernobil, descendentes de pais que limparam o reactor da central nuclear russa, registaram um grande aumento de mutações, que poderão ser de longa duração, revelou um estudo.
Mikhail Gorbachov termina o seu artigo com uma mensagem de esperança, “O 20º aniversário da catástrofe de Tchernobil recorda-nos que não devemos esquecer a terrível lição ensinada ao mundo em 1986. Devemos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para tornar as instalações nucleares seguras. E devemos também começar seriamente a trabalhar na produção de formas de energia alternativa.”
Numa altura em que o debate sobre a energia nuclear parece querer voltar à agenda política portuguesa, estas sábias palavras de Mikhail Gorbatchov, devem servir de alavanca a todos aqueles, que querem o país longe, da opção da energia nuclear.
publicado por Armando S. Sousa às 13:22

Abril 21 2006

A televisão ocupa um espaço significativo na vida quotidiana dos portugueses. Não tenho números certos, mas certamente haverão mais televisores em Portugal que lares. Independente do nível social, a televisão está presente em todos os lares e representa a principal fonte de informação e diversão, de uma esmagadora maioria dos portugueses. A televisão tornou-se hoje em dia um poder colossal, podemos dizer que é em potência o mais importante de todos, como se tivesse substituído a voz Divina. Assim continuará, por muito tempo, enquanto continuarmos a suportar os seus abusos e a sua programação de baixo nível cultural.
Fiquei a saber hoje, que existe uma Organização Não Governamental (ONG), que se propõe a discutir e a pôr em causa, a maneira como passamos o tempo em frente da “caixinha mágica”. Esta ONG é a TV-Turnoff Network( http://www.tvturnoff.org/) e a sua congénere brasileira é a Desligue a TV (www.desligueatv.org.br).
A TV-Turnoff Network, é uma organização americana sem fins lucrativos que encoraja crianças e adultos a verem menos televisão com o intuito de promover vidas e comunidades mais saudáveis. Fundada em 1994, TV-Turnoff Network dedica-se à crença de que todos nós temos o poder de determinar o papel que a televisão terá nas nossas vidas. Ao invés de esperarmos que os produtores façam uma melhor programação televisiva, podemos desligá-la com mais frequência para nos dedicar às nossas famílias, aos nossos amigos e a nós mesmos. TV-Turnoff Network já ajudou milhares de pessoas a fazerem exactamente isso. Com os seus dois programas iniciais, o TV-Turnoff Week (Semana Sem Televisão) e o More Reading, Less TV (Mais Leitura, Menos TV), ajuda as pessoas, especialmente as crianças, a desligarem a televisão e a terem actividades diferentes, especialmente ao ar livre. Na “Semana Sem Televisão”, vários programas são propostos e implementados, actividades desportivas, cinemas e teatros com promoções e horários alternativos, caminhadas ecológicas, passeio turísticos, visitas a museus com programação e preços especiais, festivais de música e poesia, livrarias como centro de convivência e estímulo à leitura, e conversa, com amigos, família e filhos. Por mais difícil que esta tarefa possa parecer, a sua forma de aplicação, agregando vários sectores da sociedade, tem atingido resultados surpreendentes, desde 1995, mais de 24 milhões de pessoas já participaram no projecto em mais de 84 países como: Canadá, México, Coreia do Sul, Noruega, Itália, e muitos outros.
Para finalizar deixo aqui as palavras de John Condry, no livro “Televisão: Um Perigo Para a Democracia”, feito a duas mãos, juntamente com Karl Popper:

“A televisão não está predestinada a desaparecer e é pouco provável que venha a constituir um ambiente favorável à socialização das crianças. É uma realidade que devemos aceitar. Podemos tentar melhorar as coisas, garantir que os programas que oferecemos aos nossos filhos sejam de melhor qualidade, mas o mais importante é mostrarmos às crianças que a televisão não é uma fonte de informação sobre o mundo. Se queremos que consagrem menos tempo à televisão, devemos propor-lhes outras actividades. O que faz falta às crianças é mais experiência e menos televisão.
A televisão não é capaz de ensinar às crianças aquilo que necessitam para se tornarem adultos. A televisão é um instrumento publicitário, e é legítimo que ocupe um lugar enquanto tal. Pode ser uma diversão, e o facto de nos divertir-mos não é mau em si. Pode ter um papel de informação e isso é uma coisa boa. Contudo não consegue ser um instrumento de socialização válido. É isso que devemos reconhecer e é sobre esse problema que devemos intervir. A escola e a família devem desempenhar um papel essencial neste domínio e agir mais do que presentemente; e é preciso ajudá-las na medida do possível. Poderíamos começar por reduzir a influência que a televisão exerce na vida das crianças. Seria um bom começo. Chegou o momento de darmos esse passo”.
Este ano, a “Semana Sem Televisão”, é entre 24 de Abril e 30 de Abril.
publicado por Armando S. Sousa às 18:31

Abril 20 2006

No final das operações de vigilância das estradas em épocas que coincidem com os principias feriados e com grandes deslocações na população, faz-se um balanço que é, invariavelmente, dramático. Os mortos são sempre muitos, os feridos imensos e os acidentes incontáveis. As causas todos as conhecem. As medidas para a resolução dos problemas não conseguem ter efeitos significativos.
Uma forma de enquadrar estas conclusões acaba por ser partilhar a experiência do que é morar na proximidade de uma estrada como o IP4 tentando, desta forma, mostrar o que significa conviver em permanência com o infortúnio resultante dos acidentes que frequentemente sucedem numa estrada como esta.
Certo dia assisti a uma conversa, quando passeava na cidade, bastante elucidativa no que diz respeito ao carácter desconcertante dos comportamentos que as pessoas foram desenvolvendo relativamente às sucessivas tragédias que ocorrem naquele itinerário O assunto era sobre a direcção que uma ambulância seguia, cuja sirene se fazia ouvir aos berros a uma velocidade quase alucinante. O seu conteúdo resume-se facilmente.
Um dos intervenientes fez referência à ambulância, o seu interlocutor rapidamente disse que deveria ser mais um acidente no IP4.Não foi o facto de ter estabelecido a ligação de imediato. Foi a forma como o disse e o timbre de voz utilizado que me deixaram espantado. Um misto de resignação conjugado com uma assustadora certeza na afirmação, como se a sua suposição fosse algo mais que isso, a única hipótese plausível para o surgimento da ambulância. Esta certeza é, por si só, absolutamente desconcertante. É como se o epíteto de “estrada da morte” implicasse de facto uma fatalidade a cada sinal de urgência. Pior que isso, o aparente condicionamento surgido da convivência diária com esta realidade, parece ter como consequência um distanciamento psicológico, em que mais um acidente já não provoca qualquer tipo de choque.
Aliás, uma das mais pungentes ocorrências que testemunhei está precisamente relacionada com o acidente de um amigo.
Num dia como tantos outros, no caminho para o trabalho, oiço no rádio a anunciar um acidente de viação no IP4. Nada de anormal até aqui. Como já sucedeu algumas vezes e porque esse é o seu percurso diário, normalmente, recebo uma chamada a pedir para eu avisar no serviço que vai chegar tarde. As filas resultantes costumam ser grandes e demoradas. De facto recebi a chamada, mas para meu espanto, não me disse que ia chegar atrasado, mas sim que o acidente tinha sido com ele.
Desloquei-me ao local e, ao chegar, o aparato do costume, enfim nada a que quase toda a população portuguesa ainda não tenha feito. Dirijo-me ao carro e subitamente apercebi-me da frágil condição humana, numa reacção desencadeada pelo aparecimento de pessoas com relações de amizade e que, instintivamente, nos fazem ceder aos nossos sentimentos mais profundos.
Assim, com a voz embargada, com lágrimas nos olhos, num rasgo de clarividência evidentemente relacionado com a proximidade com a morte, apenas disse:
-Pensei que nunca mais via os meus filhos.
Fui trespassado por um sentimento de solidariedade. Nesse momento, as lágrimas acercaram-se dos meus olhos e apenas não chorei por mero acaso.O resto não interessa.
Este drama humano, tantas vezes visto e revisto, terminou sem sequelas maiores, mas quantos e quantos não voltaram a ver os filhos, as mulheres e os maridos, os pais e os irmãos. Um manto de morte distende-se ominosamente sobre todas as estradas e parece que não faz diferença absolutamente nenhuma. Tudo o que se diz e faz não passa, por um lado, de meros artifícios de linguagem e, por outro lado medidas preventivas sem resultados, invariavelmente, são esquecidos. Nos carros, as pessoas convivem em permanência com esta condição, pensando que um dia, nesta ou naquela estrada serão confrontados com uma situação semelhante, ou pior.
Regressando às causas parece-me evidente que não podemos imputar os acidentes apenas à qualidade das estradas. As duas principais são o álcool e o excesso de velocidade.
Quanto ao primeiro, está regulado e apenas depende da consciência de cada um.
Quanto a o segundo, ocorre-me a história do escorpião e da rã: Resumidamente a rã ofereceu-se para atravessar o escorpião num riacho. A meio do caminho este espetou o seu ferrão na rã, que já moribunda lhe pergunta
– Porque fizeste isto?
Agora vamos morrer os dois.
Resposta – Não consegui evitar. È a minha natureza.
Quer isto dizer que é muito difícil resistir à tentações, aos fluxos de adrenalina provocados pela velocidade e que viciam e, com os meios disponíveis, utilizam-se. Em Portugal, o nível da falta de civismo na condução é insuperável. Após as várias tentativas infrutíferas de o transmitir à população, tudo continua vergonhosamente na mesma. É, por isso, que provavelmente não é feita a abordagem ao problema que a gravidade da situação exige.
Assim, todos sabemos que grande parte dos acidentes são provocados pelo excesso de velocidade e basta comprar uma revista da especialidade e olhar para a coluna das velocidades máximas para verificar que, pura e simplesmente, não existe uma única marca que indique que seu carro não ultrapassa os 120km/h ou mesmo, os 150Km/h.
Estamos perante, claramente, uma espécie de fábrica de ilusões. É irrefutável que saber de antemão que ao por à disposição das pessoas algo que os pode levar a violar a lei é um estímulo que deveria ser controlado por quem o pode fazer, nomeadamente o Estado, à semelhança do que faz com muitas outras coisas.
Provavelmente, o que é necessário é coragem para regulamentar e enfrentar os lóbis dos construtores de automóveis e ter sempre presente que, ao que parece, a única pessoa que conseguiu resistir à tentação, foi Jesus Cristo.
Filipe Pinto.
publicado por Armando S. Sousa às 11:18

Abril 18 2006

A História de Portugal está repleta de factos gloriosos que nos enobrecem enquanto Nação, porém, também têm alguns acontecimentos hediondos, em que o fanatismo e a intolerância, tomaram conta da multidão, levando-os a assassinar cruel e estupidamente milhares de inocentes.
Nos próximos dias, 19, 20 e 21 de Abril, cumprir-se-ão quinhentos anos, de uma das mais negras e vergonhosas páginas da História de Portugal, o massacre de, entre três mil e quatro mil, cristãos - novos na cidade de Lisboa.
Na segunda metade do século XV, a Península Ibérica tinha mais judeus do que qualquer outra região do mundo. Ocupada durante séculos pelos muçulmanos, que concediam aos judeus liberdade de culto, a Península Ibérica tornou-se um refúgio ideal e palco de uma intensa troca civilizacional entre elementos das culturas cristã, muçulmana e judaica.
Com a chegada ao poder dos Reis Católicos, Fernando de Aragão e Isabel de Castela, que se auto-intitulavam protectores da Igreja e defensores da fé e, instigados pelo triste e dramaticamente célebre Torquemada, confessor da rainha Isabel e figura principal da Inquisição espanhola, a vida calma dos judeus sefarditas estava a chegar ao fim, com o crescimento da política anti-semita, baseada no desejo de uma unificação e purificação religiosa. Torquemada explorava a desconfiança popular em relação aos judeus e difundia a suposta necessidade de que o país contasse apenas com sangue puramente cristão.
Com um clima de crescente intolerância, em 30 de Março de 1492 Fernando e Isabel publicaram o seu édito de expulsão, que determinava que os judeus que não se convertessem teriam de deixar o país até ao dia 3 de Agosto de 1492 (por curiosidade histórica, este foi o dia em que Cristóvão Colombo, deixou o porto de Palos, na sua viagem de descoberta da América), a partir daí, os que fossem encontrados seriam mortos.
Muitos dos judeus procuraram refúgio em Portugal, (os cálculos sobre os números dos que então se fixaram em Portugal oscilam, segundo as fontes, entre 30 000 e 90 000), sendo protegidos pelo rei Dom João II.
No entanto esta protecção seria sol de pouca dura, pois com a morte do rei D. João II, subiu ao trono de Portugal, D. Manuel I, que começou alimentar o sonho de ser rei de toda a Península Ibérica. O fundamental passo para a sua ambição, era o casamento de D. Manuel com a filha dos Reis Católicos, de modo a facilitar uma união dinástica, no entanto havia uma condição sine qua non para o casamento, a expulsão dos judeus de Portugal. O Rei no seu sonho e ambição, acabou por aceitar a exigência espanhola de expulsar todos os judeus residentes em Portugal que não se convertessem ao catolicismo, assim no dia 5 de Dezembro de 1496, promulgou o édito de expulsão dos judeus. Por este édito os judeus e os mouros deveriam abandonar o reino até Outubro de 1497.
Na realidade D. Manuel não tinha qualquer interesse em expulsar esta comunidade, que então constituía um destacado elemento de progresso nos sectores da economia e das profissões liberais. A sua esperança era que, retendo os judeus no país, os seus descendentes pudessem eventualmente, como cristãos, atingir um maior grau de aculturação. Para obter os seus fins lançou mão de um subterfúgio, em vez de expulsar os judeus, decidiu convertê-los à força, tendo ordenado que os filhos menores de catorze anos fossem tirados aos pais a fim de serem convertidos.

"Na manhã de 19 de Março de 1497, padres e frades alinharam-se no adro de todas as igrejas de Portugal. Mas foram muito poucos os filhos dos judeus conduzidos espontaneamente à pia baptismal. Então, os funcionários do Rei foram de casa em casa e, arrancando os filhos do colo dos pais, levaram-nos à força. Muitos pais sufocaram os filhos ao apertá-los num derradeiro abraço. Muitas mães atiraram os bebés aos poços e depois suicidaram-se". Depois, quando chegou a data do embarque dos que se recusavam a aceitar o catolicismo, alegou que não havia navios suficientes para os levar e determinou um baptismo em massa dos que se tinham concentrado em Lisboa à espera de transporte para outros países. Muitos foram arrastados até à pia baptismal pelas barbas ou pelos cabelos. Ao que parece, cenas semelhantes registaram-se noutras cidades do país. Não existe contudo documentação oficial que confirme estes factos.
No fim do mês de Setembro de 1497, ficava saldado o preço que D. Manuel tivera de pagar para casar com a Princesa Isabel, de Espanha. O Rei respondeu à namorada afirmando que já não havia nenhum judeu em Portugal.
Para além dos que anteriormente tinham aceitado o baptismo sob pressão das circunstâncias, Portugal passava então a contar com uma enorme quantidade de cristãos -novos extremamente relutantes em aceitar o estatuto que lhes fora imposto. A situação dos convertidos era agora trágica. Antes, como judeus, tinham liberdade absoluta de praticar a sua religião. Agora, como cristãos por lei, não poderiam seguir o culto tradicional senão secretamente, sob pena de graves consequências. Céptico quando à ortodoxia dos convertidos, sobretudo dos forçados, D. Manuel promulgou a 30 de Maio de 1498 uma medida no sentido de que durante vinte anos não devessem ser molestados pelas suas convicções ou práticas religiosas.

Até 1506, os cristãos - novos puderam levar uma vida relativamente calma e prosperar. Mas o clero insistia:” O comportamento ambíguo dos marranos,( termo pejorativo, que designava os judeus obrigados a baptizarem-se à força, mas que continuavam a professar secretamente a sua fé), põe em causa muitas das certezas dos cristãos. E as consequências estão à vista: os costumes vão-se degradando, treme até o equilíbrio social. São necessários castigos exemplares, regras rígidas e dissuasoras. Nos casos mais graves, a própria morte.”
Devido a uma violenta seca que assolava Portugal, no princípio do ano de 1506 Portugal estava reduzidol à fome, agravada com uma peste que assolava a cidade de Lisboa, sendo que a sua intensidade em Abril era tanta que chegavam a “morrer um cento de indivíduos por dia”. “A culpa é dos marranos, que provocaram a ira de Deus com os seus pecados contínuos”, era a opinião comum. "Na manhã da Páscoa, 19 de Abril de 1506, uma enorme multidão enche a Igreja de São Domingos, para implorar o fim da epidemia. Por entre densas espirais de incenso e cânticos lúgubres, celebra-se a missa na Capela de Jesus. No momento da consagração, do braço de um crucifixo de madeira erguido ao lado do ostensório do altar-mor, solta-se inesperadamente uma luz.

Alguém grita, Milagre! De imediato todos começaram a gritar e devido ao espanto e ao medo caíam por terra, desmaiavam, contorciam-se em convulsões, batiam no peito gritando a minha culpa. Entre a multidão enlouquecida, um marrano, murmurou, que era apenas um feixe de luz. De repente já ninguém se interessava pela cruz milagrosa. Logo se acendeu contra ele a indignação dos crentes, incitada talvez pelos autores do suposto milagre. O blasfemo foi empurrado para fora da Igreja e desfizeram-na antes de poder pôr o pé no adro. O seu corpo foi arrastado pelas ruas e depois queimado."
Entretanto, os marinheiros alemães, holandeses, franceses que estavam atracados no porto de Lisboa, juntaram-se à multidão em fúria. Seguiu-se um massacre. "Nesse Domingo, seiscentos marranos foram apanhados de surpresa nas suas cozinhas, nos pátios, nas hortas, na rua e até nas igrejas cristãs onde tinham procurado refúgio. Os homens foram degolados, as crianças esquartejadas, as mulheres violadas, foram saqueadas e incendiadas as casas, os animais, as hortas e os jardins".
No dia seguinte, dois dominicanos ,o frei português João Mocho e o frei aragonês Bernardo, alimentaram a fúria do povo marchando pelas ruas com o crucifixo milagroso na mão, e gritavam, “heresia, heresia!” incitando o povo a dar caça aos hereges. Rapidamente se alastrou o fanatismo e o desgoverno pela cidade. "
Os cristãos novos que desprevenidamente circulavam pelas ruas eram espancados e mortos, arrastados, às vezes ainda vivos, atirados às fogueiras prontamente construídas na Ribeira e no Rossio. A barbárie tomou as formas mais perversas, dando lugar à vingança, à calúnia, à luxúria e ao roubo. Alguns dos cristãos velhos foram perseguidos e, para se salvar, tiveram que mostrar que não eram circuncidados. Invadiram e saquearam as casas dos cristãos novos, maltratando homens, mulheres, velhos e crianças. Tomavam crianças dos peitos das mães e, segurando-as pelos pés, atiravam-nas contra paredes, esmagando seus crânios. Donzelas e mulheres casadas eram violadas e atiradas às fogueiras espalhadas pelas ruas inundadas por sangue. Com a chegada da noite veio também o cansaço dos carniceiros e a barafunda cessou, dando oportunidade para que os cristãos novos fugissem ou se escondessem, auxiliados por cristãos velhos verdadeiramente tementes a Deus". Nesse dia morreram cerca de dois mil cristãos novos. Na terça, 21 de Abril, como as vitimas escasseavam a multidão foi-se acalmando, deixando atrás de si, entre três e quatro mil lisboetas mortos.
Entretanto um mensageiro tinha ido ao encontro do Rei D. Manuel I, que devido à peste se encontrava, no seu palácio em Abrantes, para lhe dar conhecimento do massacre que estava em curso na cidade de Lisboa.
"O Rei Dom Manuel foi arrebatado por uma raiva incontrolável. Ficou horrorizado com a terrível matança, mas acima de tudo não admitia que os padres se arrogassem o direito de provocar massacres, e ordenando o castigo de quem provocara o “santo delírio”, enviou para Lisboa um pequeno exército chefiado pelo regedor Ayres da Silva e pelo governador Álvaro de Castro.

Os dois frades foram destituídos, estrangulados e queimados na fogueira. Foram executados mais 30 homens vistos a apunhalar, estuprar, desmembrar e queimar marranos. Os cidadãos em geral foram multados num quinto das suas propriedades e privados do direito de eleger os conselheiros comunais. Lisboa foi castigada com a proibição de exibir, durante seis meses, o altíssimo título de “cidade sempre leal”.
publicado por Armando S. Sousa às 06:18

Abril 15 2006

Um leigo não pode ter a presunção de querer discutir religião a um nível demasiado elevado. O que se pode discutir são sentimentos. Uns sentem que não existe Deus, afirmação tão válida e respeitável como dizer o contrário. O problema é esta espécie de transe religiosa do qual não se consegue escapar por manifesto condicionamento, e que é continuamente alimentada por uma máquina de propaganda que exacerba os sentimentos religiosos, colocando-os no topo das preocupações existenciais sem a devida relativização. Neste sentido, mesmo nos tempos que correm, por vezes somos confrontados com algumas coisas que são absolutamente desarmantes. Por exemplo, descobrimos através da comunicação de um auto proclamado porta-voz da divindade, que algumas das principais actividades do mundo moderno podem ser consideradas pecados.
Uma pequena reflexão levanta uma questão pertinente. Quais os reais motivos que levam a considerar navegar na Internet, ver Televisão ou ler Jornais um pecado, mesmo se o tempo gasto nelas for superior ao que se “perde” a ler as sagradas escrituras? A resposta é obviamente simples, qualquer destas acções pode ter como consequência o despertar para as contradições entre o professado pelas religiões e a vida real. Enquanto que a formação hermética das sagradas escrituras impede a libertação do pensamento ao condicioná-lo nas suas opções e horizontes, qualquer destas práticas, no limite, tende a eliminar as barreiras da ignorância.
Ao que parece, estes pecados da era moderna não foram integrados por decreto papal em nenhuma lista oficial desta índole, o que seria supremamente irónico atendendo ao dogma da infalibilidade do Papa. Até porque afirmar que não é o acto em si, mas o tempo que se ocupa em cada uma das coisas que é importante, não é algo facilmente assimilável. Será que não é mais importante uma atitude correcta perante a vida do que ler as sagradas escrituras? Será que fazê-lo no lugar das outras coisas, confere ou retira dignidade moral enquanto ser humano? Se assim for, quem não dedicar tempo nenhum ás sagradas escrituras, ao fim de três segundos na Net, na TV ou a ler jornais, torna-se imediatamente um herege.
Em relação à televisão, ver alguns dos programas é realmente um pecado. Só que isto está apenas relacionado com o conteúdo e não com tempo que se passa em frente ao televisor. Mas mesmo assim, tais comportamentos têm de ser compreendidos. A vida, por vezes, é tão difícil que as pessoas precisam é de algo que as entretenha e não de ler um livro que ao longo das suas páginas, na sua análise ascética da natureza humana, lhes diz que tudo o que fazem é pecado. Na verdade, alguns dos programas são absolutamente inúteis e, portanto, o tempo poderia ser ocupado a ler jornais ou livros. Só que isto também é pecado. Se bem que em Portugal, atendendo aos números da literacia, o cumprimentos desta espécie de decreto já é seguida há muito tempo. Há sempre coisas em que nos conseguimos antecipar.
Como normalmente acontece, em face das críticas, inicia-se a vitimização. Acusam-se os que se pronunciaram contra esta espécie de censura de terem retirado do contexto as palavras proferidas e, na falta de argumentos, atacam quem se levanta contra as suas tentativas de condicionamento global. O mais comum é afirmar tudo não passa de uma alerta contra os comportamentos da sociedade e não como qualquer tipo de censura. Depois aparecem os seus arautos. Os defensores da moral religiosa e da sua prevalência sobre Homem, acusando quem não assume a sua fé (católica), de ser desequilibrado, e de não resistir ás tentações do mundo. Ou então a afirmar que se deveriam queimar todos os livros que questionam as palavras da Igreja Católica. Queimar livros, na essência, é queimar também quem os escreveu. Uma espécie de regresso ao período da inquisição, substituída pela inquisição ao pensamento, ao tentar obliterar qualquer forma de liberdade intelectual que não seja a sua.
Mas isto vai mudar. Se Deus quiser. Lá estou eu a pecar. A invocar o Santo nome de Deus em vão. (Ou não?)

Filipe Pinto.
publicado por Armando S. Sousa às 20:03

Abril 13 2006

Considerado um dos maiores escritores e dramaturgos do século XX, o irlandês Samuel Beckett , faria hoje 100 anos se fosse vivo.
Samuel Beckett nasceu a 13 de Abril de 1906, na localidade de Foxrock, perto de Dublin, na Irlanda. Nascido no seio de uma abastada família protestante, não teve uma infância muito feliz e depressa se tornou num jovem infeliz. Inadaptado às regras de uma sociedade que considerava repulsiva, refugia-se na solidão, que faz transparecer em toda a sua obra.
Em 1923 ingressa no Trinity College, de Dublin para fazer a sua formação académica, onde em 1927, se licenciou em línguas modernas, francês e italiano, com uma excelente classificação.
Em 1928, Beckett mudou-se para Paris, onde conheceu James Joyce, e depressa se tornou um seguidor do escritor. Esta amizade será decisiva para a sua carreira literária. Aos 23 anos, escreveu um ensaio em defesa de "Ulisses", a obra-prima de James Joyce, que tinha sido proibida na sua Irlanda natal.
Depois de um estudo sobre Proust, Samuel Beckett, chegou à conclusão que o hábito e a rotina eram o “cancro do tempo”: o tempo, inexorável, ao qual estamos presos. Samuel Beckett, faz questão de nos lembrar, que a cada momento, o fim se aproxima, que a morte espreita, que o jogo irá acabar e nós irremediavelmente, perderemos. Se temos conhecimento disso, então por que continua-mos à espera?
Porquê? Porque devemos saber que enquanto se espera a vida continua e devemos vive-la da melhor forma possível, a cada segundo, compreendendo-a pequena e grandiosa ao mesmo tempo.
Por causa destas conclusões, abandonou o seu cargo no Trinity College e iniciou uma viagem pela Europa, visitando a França, Inglaterra e a Alemanha, onde viveu as mais diversas experiências que depois se traduziram em personagens.
Em 1938 fixou residência em Paris, onde dois acontecimentos o vão marcar para o resto da vida: é gravemente ferido ao ser agredido por um estranho, que lhe desferiu uma facada no peito, e conhece Suzanne Deschevaux-Dusmenoil, o amor da sua vida e com quem se casaria em 1961.
Durante a Segunda Guerra Mundial, Beckett permaneceu em Paris, onde lutou pela Resistência, até que alguns membros o seu grupo foram presos e Beckett foi forçado a refugiar-se, com a sua mulher na zona conhecida como "França Livre", a parte da França que não tinha sido ocupada, pelas tropas nazistas.

Em 1945, regressou a Paris e iniciou o seu período mais prolífico enquanto escritor. No período cinco anos, entre 1948 e 1953, produziu a sua obra mais significativa. Escreveu "Eleutheria" (1948), "À espera de Godot" (1952), e a trilogia, universalmente aclamada como essencial à compreensão da experiência humana, “Molloy” (1951), “Malone está a Morrer” (1951) e “O Inominável” (1953).
O seu primeiro sucesso, chegou, em 1952 com "À Espera de Godot". Apesar das especulações, a pequena peça onde nada acontece, tornou-se num sucesso repentino e um marco no teatro do absurdo. As personagens desta peça, exemplificam a situação do homem encurralado num mundo de rotina: dois vagabundos, Vladimir e Estrabon, indecisos e inertes, esperam em vão a chegada de um personagem enigmático e misterioso, Godot, símbolo do inalcançável, que de um modo inexplicável, melhorará as suas vidas.
Depois do sucesso de "À Espera de Godot", Samuel Beckett dedica-se a traduzir os seus textos para inglês e volta a escrever nesta língua, construindo, um caso raro na Literatura moderna, uma obra bilingue.
As obras de Beckett traduzem com um grande poder de síntese, toda a condição humana. As questões que são necessárias esclarecer dessa condição são amplamente trabalhadas e poeticamente materializadas. Os personagens das suas obras, reflectem a posição do autor em relação à vida, à morte, aos desejos, aos fracassos e à impossibilidade da felicidade.
O reconhecimento crescente do seu trabalho culminaria com o Prémio Nobel da Literatura, em 1969. Depois disso e apesar de ser aclamado a nível mundial, continuou a escrever até à sua morte, que ocorreu em Paris, a 22 de Dezembro de 1989, vitima de enfisema, contra o qual lutou nos últimos três anos, da sua vida .
publicado por Armando S. Sousa às 12:07
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Abril 12 2006

A Terra é azul!
Uma expressão banalíssima, no entanto, há precisamente 45 anos, era uma novidade planetária!
No dia 12 de Abril de 1961, Yuri Gagarine ficaria conhecido na História como o primeiro ser humano a viajar no espaço, a bordo do Vostok 1. Iria viver um sonho inspirado sessenta anos antes pelo cientista russo Constantin Tsiolkovsky, que no início do século XX já tinha arquitectado a base da astronáutica moderna.
Eram 7h07, no Cosmódromo de Baikonur no Casaquistão, quando a nave Vostok 1, descolou para o seu primeiro e único voo espacial. Pouco depois da descolagem, a 327 quilómetros de altura, Yuri Gagarine, por rádio, anunciava a todos os humanos a cor do nosso Planeta:
A Terra é azul!
Foi a exclamação do primeiro homem a ver o nosso planeta do espaço.
Foi um pequeno voo de 108 minutos, o suficiente para que Gagarine se tornasse, aos 27 anos num herói mundial.
Às 9.20 daquele 12 de Abril de 1961, Gagarine aterrou de pára-quedas, junto ao Volga, 700 kms a Sudeste de Moscovo, na aldeia de Saratov, uma camponesa e a sua filha não ganharam para o susto quando apareceu um ser vestido de cor-de-laranja e de escafandro.
-Vens do espaço?
Perguntou a anciã.
-Certamente sim, disse Gagarine, que se apressou a acrescentar, não se alarme, sou soviético.
Tratava-se do primeiro cosmonauta, acabadinho de chegar do espaço, onde esteve durante meia hora, tendo sido forçado a ejectar-se do Vostok 1, a uma altitude de sete mil metros.
Até ao desmoronar da União Soviética esta pequena história dentro da História foi ocultada. Seja pelo caricato da situação seja pelo facto de ter temido a desclassificação do feito por parte da Federação Internacional de Aeronáutica - um recorde só é validado quando tripulante e nave aterram juntos - o certo é que Moscovo ocultou os pormenores do regresso atribulado de Gagarine.
Quando o Vostok 1 estava a sobrevoar o continente africano tudo começou a correr mal. Na altura em que a aproximação ao planeta deveria começar, a cápsula não se soltou do módulo. Gagarine passou uns minutos agitados, para não dizer mais, até que a separação teve lugar, dez minutos depois do planeado. O jovem cosmonauta não teve tempo para retemperar forças: a sete mil metros de altitude a escotilha cede e vê-se obrigado a fazer o restante percurso de pára-quedas.

Quando chegou ao solo foi à procura de um telefone:
“-Está?
-É do Cosmódromo de Baikonur?
-Daqui fala Yuri Gagarine, na região de Saratov. É só para comunicar que já estou na Terra».
Podia ser o final de uma anedota, mas não é, foi através de um simples telefonema como este , hoje parece absolutamente incrível, que as autoridades soviéticas tomaram conhecimento do fim do primeiro voo espacial.
Durante a sua curta viagem, Yuri Alekseyevich Gagarine subiu dois postos na hierarquia militar, sendo promovido de tenente a major.
Yuri Alekseyevich Gagarine, nasceu no dia 9 de Março de 1934, em Klushino, mais tarde rebaptizada com o seu apelido, filho de um carpinteiro.
Quando tinha 7 anos, os alemães invadiram a União Soviética, o pai alistou-se no Exército Vermelho enquanto a sua mãe, ele, o irmão mais velho e a irmã se refugiavam num local mais seguro.
Já em plena Guerra Fria, ingressa numa escola, onde se forma em metalurgia, até ser chamado pela Força Aérea, em 1955.
Se é certo que o baptismo de fogo esteve longe de correr da melhor maneira, a partir daí Gagarine começou a evidenciar-se como um dos alunos mais valorosos. Graduou-se em 1957, pouco depois de Moscovo ter surpreendido o mundo com o lançamento do «Sputnik»,no dia 4 de Outubro de 1957, o primeiro satélite que o Homem colocou em órbita, tendo desencadeado a corrida espacial.
Em 3 Novembro, ainda longe de se imaginar no espaço, Gagarine casa-se com Valya, no dia em que a famosa cadela Laika foi colocada em órbita, a bordo do «Sputnik 2». Após a sua formação, foi colocado na Base Aérea de Murmansk, junto da fronteira com a Noruega, onde devido ao clima, voar era um risco sempre presente.
Dois anos depois, a Força Aérea pede voluntários, numa altura em que a União Soviética explora a Lua, com o envio das sondas «Lunik». Dos 3500 inscritos, foram escolhidos seis. Além de Gagarine, faziam parte dos eleitos Gherman Titov (que foi o primeiro cosmonauta a perfazer mais do que uma órbita, a bordo do Vostok 2), Valeri Bykovsky, Grigory Nelyubov, Adrian Nikolaev e Pavel Popovich.
O chefe do projecto espacial, Sergei Korolev, numa desconcertante atitude democrática, pediu certa vez aos seis futuros cosmonautas para elegerem quem devia fazer as honras do voo inaugural. «Tovarich» Gagarine recolheu três votos.
Dois dias depois, da mítica viagem, a 14 de Abril de 1961, a Praça Vermelha foi palco de uma recepção apoteótica ao “Magalhães do Espaço”, à qual não faltou sequer o líder da União Soviética, Nikita Krushtchev.
As aventuras espaciais do rapaz que ia ser metalúrgico não voltaram a repetir-se. Com a sua figura imortalizada em estátuas e selos, o nome na toponímia e o feito nas páginas de História, Gagarine regressou à sua condição de piloto da Força Aérea. Contudo, não aguentou o peso da fama tornando-se alcoólico.

Em 1962 foi eleito/nomeado deputado ao Soviete Supremo, tendo depois voltado para a “Cidade das Estrelas”, a base soviética de pesquisas e ensaios dos voos espaciais. Em 1967 foi escolhido para o lançamento do Soyuz, contudo este projecto foi abortado, após o acidente com o Soyuz que vitimou Vladimir Komarov.
E foi no «cockpit» de um caça MIG-15, em 27 Março de 1968, que o primeiro homem a orbitar a Terra morreu, durante um voo de rotina junto a Kirzhach. Há várias teorias sobre a causa da trágica morte de Gagarine, que vão desde o assassinato por parte do KGB, passando pela teoria que estava embriagado aos comandos do Mig 15, e finalmente, a teoria mais provável, da despressurização da cabine, que levou a tripulação, devido à falta de oxigénio, a perder o controle do avião e a despenhar-se.
Tinha 34 anos.

publicado por Armando S. Sousa às 11:51
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